segunda-feira, 20 de outubro de 2008

Lírica

A Tristeza, de dentes alvos e afiados

Vive presa numa jaula de grades feitas de fios de seda

Tecidos por nós, que tanto a tememos.

Desde tempo imemoriais ela lá vive

E desde sempre lutamos para acreditar

Que ela não foge porque assim o queremos.

Mas, a um só vacilo,

A fera está solta

A devorar pessoas, sonhos...

E apenas assistimos, aterrorizados.

Vítimas uma a uma sucumbem ao seu apetite voraz

Mas ela parece nunca estar saciada

Ao contrário, busca mais e mais

Como se quisesse compensar todo o tempo em que ficou aprisionada.

E as baixas são tantas, tantas...

E pensamos “como deus permite que viva assim entre nós tão amaldiçoado flagelo?

Como nos dá a Alegria apenas para servir de alimento à fera?”

Mas eis que então dos céus (ou ao menos pensamos vir de lá)

Vem uma voz que diz:

“Não me imputes uma culpa que só a ti pertence.

Eis tua filha, tua cria e criação.

Sede um bom pai, acolhei-a, ou ao menos, assuma-a”

E quedamos calados então.

A assistir ela agir, seguindo sua natureza,

Ir consumindo tudo até chegar o momento terrível

Em que só restará a nós mesmos

Sê-la derradeira refeição.

domingo, 21 de setembro de 2008

O som do sol

Uma vez uma amiga me disse que os cegos sabem a hora, ou se é dia ou se é noite, apenas ouvindo o mundo. Para mim, uma idéia estranha, mas na argumentação dela fui indo, indo, indo até concordar. 

O som dos pássaros, o barulho da rua, estes seriam alguns dos referenciais por eles utilizados. Então pensei: por quê não também o barulho do sol? Pois para mim o sol tem som, desde criança penso nisso. Não apenas o sol, pensando bem. Qualquer luz, de maneira geral.

E nada de pensar no movimento onda/partícula da luz, não ir assim tão longe. Sentir, mais que ouvir. Como a gente sente o amor de alguém por nós. Ele vibra tanto, mas tanto, que acaba gerando alguma forma de energia que potencialmente pode, também por sua vez, produzir alguma espécie de som.

Desculpem pela viagem, mas junte muitas horas insones em um aeroporto com saudades diversas, ausências enormes, sentimentos avassaladores e têm-se espaço para elocubrações deste porte. Afora isso, juro que sempre pensei no barulho do sol...

domingo, 14 de setembro de 2008

Para uma canção, talvez...

Quem acredita na paixão
Ou no destino pro coração
Encontrar sossego ou resposta
Vive perdido, na ilusão
Porque o sonho traz consigo
O desejo, o impossível
Que turva, e abre caminho
Para a solidão
Não, não tente mirar no amor
Pois ele é pássaro
Mal o achamos e já voou
Deixe o destino dos outros
Seguir seu rumo em paz
Não negue sua cruz, nem suas penas
Somente siga em frente sem olhar para trás

quarta-feira, 10 de setembro de 2008

Paranampuca

Estou apaixonado pelo baixo acústico (double bass ou "dog house", pros norteamericanos). Há varios anos penso em adquirir um, no entanto, faltava-me algumas coisas, além do dinheiro para tal. O principal era a concepção de que eu necessariamente não tinha a obrigação de ser um virtuose (estou muito longe disso) e que seria "digno" de ter/tocar um...

Complexos superados à parte, estou na fase onde mais me divirto, ou seja, a da descoberta. Coisas da paixão.
Estou lendo coisas, estudando, descobrindo, me encantando. Principalmente porque comprei o instrumento em São Paulo há um pouco mais de quize dias e nada dele aportar nesta minha terra maravilhosa, quente e úmida.

Ah, meu Pernambuco... Paranampuca, estudei no primário, era a origem tupi do nome de minha terra. Significa “mar que quebra na pedra”. Terra musical, que o nome já entrega pelo "chuá-chuá" sincopado, hipnótico e incessante que embala e seduz ao longo de toda a costa.

Terra de gente musical. Tá no sangue, não tem jeito. É frevo, é maracatu, é caboclinho. Tem até bumba-meu-boi, que dividimos a paternidade com os nossos amigos maranhenses (se bem que caso fosse possível fazermos um teste de paternidade, esse menino seria nosso por afinidade e criação...).

Pois bem, juntando as duas pontas, descubro em minhas pesquisas que a madeira que normalmente é utilizada para a confecção do arco utilizado para gerar aquele som maravilhoso nos instrumentos da família das cordas nas orquestras é o pau brasil. Mas o melhor vem agora: sabe como o pau brasil é bem conhecido lá fora? Pois se acertar vai ganhar uma caixa de Xaxá de Banana: Pernambuco! Isso mesmo.

Quando o assunto é arco, é a melhor madeira. Inclusive, o nominho chega fica doce na boca de gringo quando fala que "the ebony joins with the pernambuco" no arco. Assim mesmo, em minúscula. Nome técnico, mas com jeito carinhoso, feito "nega".

O negócio é tão sério, que existe até ONG nos Estados Unidos para preservar o pau brasil, digo, o Pernambuco: International Pernambuco Conservation Iniciative. Se duvida, vá conferir no site.

Pois é... Eu que sempre considerei-me um ser enraizado, quem diria que meu Estado estaria tão mais próximo de mim, nas minhas mãos para fazer uma música que sempre esteve em minha cabeça e nos meus sonhos...

Saio daqui não, seu Zé. E quem for sabido, que volte pra esta (sua) terra!

sábado, 30 de agosto de 2008

Too much information

Não posso passar muito tempo sem escrever aqui... As idéias vão acumulando e começam a me sufocar... Amanhã eu faço um descarrego.

sábado, 23 de agosto de 2008

À la grega

Duas semanas em São Paulo (com direito a dois finais de semana inteiros) mexem com qualquer um. O burburinho da cidade, as cores maravilhosas, a pulsação, a clara idéia de que a cidade realmente tem vida própria...
Amo esta cidade. Sua solidão consentida, suas ladeiras, seus escuros e ermos permitidos e abertos ao libidinoso.

Ontem fui jantar em mais um desses lugares onde tem-se a certeza que só poderia estar-se em Sampa: Acrópolis.

O proprietário do lugar (que já existe há mais de 50 anos), é um "senhorzinho bonitinho", como diria uma querida amiga, que serve a todos pessoalmente, com um carinho inacreditável para um lugar que funciona todos os dias, inclusive aos domingos...

O restaurante já nos pega pelo inusitado: não tem cardápio. Você vai até a cozinha e escolhe no olho o que quer. Mas uma coisa é certa: ir até lá e não experimentar a musaka (uma espécie de lazanha com queijo gratinado, berinjela e algo mais que esqueço agora) é simplesmente inescusável. Musaka é a versão definitiva de (excelente) sexo em forma de comida. Simplesmente divino.

O lugar tem um charme todo especial pela simplicidade, mas o dono, sr. Petrakis, é algo à parte.

Jeito de vô que viu o mundo todo e passa o filme dos melhores momentos ininterruptamente em suas íris pra gente assistir embevecido, de fala fácil muito embora difícil de entender seu português, o polegar discretamente colocado sobre o pão para ter certeza de que o mesmo está quente, o jeito de servir quase de um pai sentado à mesa e dividindo a comida entre os filhos respeitosos e famintos.

E como esse mundo mundo vasto mundo não poderia deixar de reservar mais uma de suas sobejas ironias, ele é casado com uma pernambucana. Epa!!!!

quinta-feira, 14 de agosto de 2008

E mais Titãs...

Final dos anos 80...
Muita música, muitas idéias e muitos sentimentos. O engraçado é que alguns só agora eu estou entendendo e resolvendo, mas enfim...

Medo

Precisa perder o medo do sexo
Precisa perder o medo da morte
Precisa perder o medo da música
Precisa perder o medo da música
O que se vê não se via
O que se crê não se cria
Precisa perder o medo da musa
Precisa perder o medo da ciência
Precisa perder o medo da perda
Da consciência
O que se vê não se via
O que se crê não se cria
Precisa perder o medo de mim
Precisa perder o medo de mim
Precisa perder o medo da música
Precisa perder o medo da música
O que se vê não se via
O que se crê não se cria
Medo medo medo medo
O que se crê não se cria
Precisa perder o medo da musa
Precisa perder o medo da musa
Precisa perder o medo da música
Precisa perder o medo da música
Medo medo medo medo
O que se crê não se cria


Precisamos perder esses medos todos. Pra sempre.

segunda-feira, 4 de agosto de 2008

E mais palavras...

Desta vez, socorrem-me os Titãs.
Bem apropriado, pensando bem. À altura da tarefa.
As coisas que falam por si teimam em ser ditas, não há escapatória. Sentimentos virarem palavras definitivamente não é um processo fácil, muito menos indolor.
Mas as coisas pulsam, e seu pulsar condiciona-se à necessidade de dar-se vazão às mesmas.
E para isto, apenas palavras.
Bem entendidas ou não. Bem aceitas, quem sabe.
Mas necessárias, como são todas as coisas que realmente importam. Ou mais até: imprescindíveis.


Palavras

Palavras não são más
Palavras não são quentes
Palavras são iguais
Sendo diferentes

Palavras não são frias
Palavras não são boas
Os números pra os dias
E os nomes pra as pessoas

Palavra eu preciso
Preciso com urgência
Palavras que se usem
em caso de emergência

Dizer o que se sente
Cumprir uma sentença
Palavras que se diz
Se diz e não se pensa

Palavras não têm cor
Palavras não têm culpa
Palavras de amor
Pra pedir desculpas

Palavras doentias
Páginas rasgadas
Palavras não se curam
Certas ou erradas

Palavras são sombras
As sombras viram jogos
Palavras pra brincar
Brinquedos quebram logo

Palavras pra esquecer
Versos que repito
Palavras pra dizer
De novo o que foi dito

Todas as folhas em branco
Todos os livros fechados
Tudo com todas as letras
Nada de novo debaixo do sol

domingo, 3 de agosto de 2008

POP!

Acabo de descobrir que aquele grão de milho que não vira pipoca atende pelo singelo (e esquisito) nome de "mururu". É o autêntico "vir a ser".

Existem sentimentos mururus. Ou melhor, pessoas que permitem-se viver sentimentos mururus. Não sei se por medo, não sei se por conveniência, talvez por não quererem mesmo. Ou por diversão, vai-se entender as idéias que vivem nas cabeças das gentes...

Só sei que eu adoro pipoca. E faço bem, por sinal. Não deixo nenhum mururu. Nunca.

sexta-feira, 1 de agosto de 2008

Geral

Alguém aí já se sentiu como um playground?

O Plano...

Ontem fui a uma loja dessas onde vendem acessórios para celulares, pois eu estava realmente precisando trocar o fone de ouvido do meu. Sou atendido por uma moça muito simpática, novinha.
Ela me vende por um preço até legal.

- É Nokia original, benção!

Finda a venda, pergunta se eu aceito um papel "com a palavra de Jesus". Crente. Pra ser simpático aviso que minha mãe e meu irmão são presbiterianos. E vou logo dizendo que "sou meio banda voou" - pois pensei que vai que dissesse que era budista, corria o risco de sei lá, um exorcismo, nunca se sabe...
Mas ela, muito crente, me diz:

- Benção, mas tenha certeza que Jesus tem um plano para você.

Saí pensando nisso. Andando e pensando. Pô, plano pra mim? Será que eu poderia ao menos ter o direito de saber qual seria este bendito plano? Ironias à parte, não me agrada nem um pouco a possibilidade de que todos os meus passos, minhas falas, tudo enfim esteja seguindo um roteiro. Não que a esta altura da minha vida eu não me divirta bastante com as enormes "coincidências" que tem acontecido - principalmente no presente momento e passado recente - e que não me furte de pensar que parecem coisas realmente orquestradas...

Uma pausa: na sequência, andei ainda feito um condenado por vários lugares em busca de um controle remoto novo para o alarme do carro, que encontrei numa loja na qual uma pessoa vira pra mim e pergunta: você é Marcilio, né? Ainda toca? E calha de ser exatamente o irmão de uma pessoa maravilhosa e com a qual tive o enorme prazer e privilégio de conviver, deixando um rastro de coisas muito boas em mim. Há tempos venho tentando localizá-la, pois os caminhos e as circunstâncias da vida levaram-na pra bem longe - e eu nem sabia o quanto, geograficamente. Ou seja: mais passado, mais coincidências.

Voltando ao tal "plano", agora nas minhas divagações noturnas, mesmo com todas as pessoas-bumerangues, histórias-bumerangues, continuo relutante à aceitação da idéia de algo pré-determinado que norteie as vidas das gentes. Essa coisa determinística não me agrada o juízo. Tudo bem, confesso que às vezes me vejo meio entre estes dois mundos (o real e outro de dimensões paralelas e quase surreais), mas acho que no final de tudo, essa coisa toda acaba sendo uma só. Facetas de um diamante: mudam o ver, mas o sentir-essência permanece rigorosamente o mesmo.

Mas agora me bateu: e se o fato de estar escrevendo exatamente neste momento sobre a negação do Destino não estaria eu exatamente corroborando sua existência?

Bem, na dúvida, vou salvar o post, fazer pipoca e ver Carl Segan falando em "Cosmos" (que por sinal, quem quiser comprar o pacote de DVDs ou baixar mesmo, recomendo muito fortemente. Mesmo para os que não são aficcionados por Astronomia. Além de um texto poético, a fotografia - no que meus olhos de leigo permitem captar, claro - é massa e a sua visão de que todos não passamos de "poeira cósmica" - o que em última instância é a mais absoluta verdade - nos remetendo à necessidade de enxergamos tudo no universo como parte de nós mesmos e vice-versa já vale o tempo dispendido para devorar os 13 episódios de 1 hora e pouco cada).

Quem sabe assim, eu não surpreendo o Destino fazendo isso? Afinal de contas, toda minha vida me empenhei em dar sustos nele mesmo...

quinta-feira, 31 de julho de 2008

"Ninguém merece!"

E por falar em cafonice, que atire a primeira Revista da TV quem não carrega no seu íntimo, enquanto pessoa (olha uma aí!) alguma coisa meio breguinha escondida. Vale uma letra de Roberto Carlos na ponta da língua, uma lista de nomes de personagens de novelas na memória, umas roupas entocadas em alguma gaveta, lindas para o tempo em que se comprava Xaxá de Banana...

Claro que tenho as minhas também, inconfessáveis, como aqueles segredos que João Ubaldo Ribeiro lembra que todos carregamos em nossas biografias.

Mas incomodam-me demasiadamente essas frases de novela, que saem pelo tubo e entram nas cacholas desavisadas e que dali para o papo do dia-a-dia despretensioso é tão rápido... Mas o popularesco vira tão popular que às vezes não dão-se conta quem as profere.

Profere, sim, feito palavrão. Aliás, palavrões são mais bonitos. Ao menos etimologicamente têm esteio. Estas outras, são coisas feias, sem graça, que mal sobrevivem (ainda bem) à duração da maldita novela. Odeio novelas. Mas esta é mais uma das minhas idiossincrasias que faço questão de postar com calma, um dia.

Enquanto isso, que tal nos revoltarmos um pouco e tentarmos, na medida do nosso possível, varrer do mapa estas malditas expressões, pois afinal de contas, ninguém merece(-as)!

El Pasado

Quem não viu, veja. Filme bom.

Mas falando em passado, é engraçado como ele chega de repente e nos encontra com aquela cara de "rapaz, quanto tempo". E chega sem avisar, da uma maneira tão inusitada que chega a ficar difícil comentá-la sem parecer demasiado piegas.

Mas muito mesmo a ponto de que nem roteirista de novela mexicana (daquelas que até hoje não entendo porque começavam na terça ou na quarta-feira) teria a cara-de-pau de colocar na trama...

quarta-feira, 30 de julho de 2008

Musical

O descompasso das coisas da vida e das gentes me assombra, sempre.

O nove nunca é dez
O nono sempre pecado
Noves fora de mim, zero.

Descobri, meio sem querer, meio procurando sinais, uns sites sobre astrologia. Neles, a descrição das características do meu signo (Câncer). Para meu quase assombro, muitas coisas bateram. Muito, inclusive. E olha que ainda fiz o teste de ler qualquer outro signo só para destruir a credibilidade da coisa. Em vão.

Era pra mim mesmo. Sentimento de manada à parte, coincidência ou não, mora na crueza de certas verdades universais e comuns respostas para questões tão íntimas? Para que psicoterapia então, afinal? Não, não... Não é tão fácil assim. O troço é mais além. Mais dentro, mais fundo. (Muito embora eu continue achando interessantíssimas certas coisas "do astral".)

Acabo de fechar importantes ciclos, encontro-me ainda em meio a alguns deles, enormes. Mas sempre em movimento. Ainda vejo-me na janela, mas na cabine do motorneiro agora. Perdi muitas coisas, desfiz-me de grande parte delas, incorporei novas, começo a entender minha pupa.

Vejo com grande alegria a celebração da vida de pessoas muito queridas, seus passos cada vez mais firmes. Decerto que alguns passos não se encaixam em nenhum tipo de dança conhecido ou a música que as embala a mim é defeso reclamar a contraparte, enfim... Fico feliz mesmo assim, com algum aperto no coração, mas fazer o quê?

O descompasso nas vidas das gentes pode ser mesmo imenso... Mas sempre haveremos de encontrar o "um".

E como aprendi outro dia, não se pode parar a música da vida e gritar: "Da capo!"

terça-feira, 22 de julho de 2008

quarta-feira, 16 de julho de 2008

Acredite. É uma letra de música.

Mas parece um soco na boca do estômago... Aparentemente composta pelo próprio Tim Maia

Essa Tal Felicidade

Já rodei todo esse mundo procurando encontrar
Um amor, um bem profundo que eu pudesse realizar
Os meus sonhos de criança, como todo mundo faz
De formar uma família como era dos meus pais

Mas o tempo foi passando e a coisa mudou
Solidão foi se chegando e se acostumou
Essa tal felicidade, hei de encontrar

Mesmo se eu tiver que procurar, se eu tiver que esperar.

De uma coisa eu não desisto, sou fiel não abro mão
De ter filhos, ter amigos, companheira e irmãos

Se essa vida é bonita, ela é feita pra sonhar
Mais aumento o meu desejo de afinal te encontrar

Mas o que eu não me acostumo é com a solidão
Um pedaço do seu beijo ou seu coração
Isso já me fortalece me faz delirar

Mesmo se eu tiver que escolher, se eu tiver que esperar.

terça-feira, 15 de julho de 2008

A única pérola do colar

Por mais uma feliz indicação, tive contato com (por enquanto apenas o site, mas irei certamente visitar na minha próxima viagem a São Paulo) o Museu da Pessoa

A idéia é simples (ou não, pensando bem...): a pessoa registra uma história qualquer vivida e esta passa a fazer parte do acervo do museum. Como disse quem me indicou, se mentir entra também, mas perde-se uma excelente oportunidade...

Pus-me a pensar: o quanto pode ser difícil contar uma história nossa? Querer ser engraçado? Querer parecer profundo? Tentar apelar para a dramaticidade? Não sei... Não me parece muito fácil. Nossa singularidade, por si, só já garante uma sombra de originalidade numa ação inusitada como esta. Mas até que ponto somos de fato singulares? Costumo dizer que todos buscamos a unicidade, mas somos reféns de nossos próprios nomes, logo de saída, que nos evita sermos tão originais assim (exceção feita para aqueles terríveis nomes inventados ou frutos de um matelassê ascendente nominal - tem que chamar assim, de nome mesmo, pois são próprios...).

Acho que no fundo todo mundo busca de um jeito ou de outro ser um pouco único. Não que o simples fato de existir já não nos garanta isto, afinal desde nossa percepção mais básica à complexa está alicerçada num sistema que parte até mesmo do orgânico (como enxergamos o azul ou a forma como ouvimos determinada música, de acordo com as nossas características/limitações auditivas a determinadas freqüências). Não é isso. Esta já nos é garantida. falo da outra, daquela que nos coloca como seres "diferentes".

Em contraponto a isso sempre pensei: se fossemos de fato assim, tão diferentes e distintos, como existiria a Psicologia, por exemplo? Como seria possível traçar uma linha evolutiva no pensamento filosófico ocidental? Quando entro por essa linha de pensamento, invariavelmente me vêm à mente duas coisas: Pavlov e o inconsciente coletivo.

Daí derivo para Sex And The City e toda sua horda de fãs maravilhadas com o rudimentar e estúpido, mas ao mesmo tempo inteligente (do ponto de vista comercial), jogo de dividir a psique feminina em 4 personagens e que fazem-nas, suprema burrice, como que por magia "encantarem-se" a ponto de dizerem "Ah, mas eu sou 25% Carie, 45% Miranda e o resto Samantha"...

Não sou igual a ninguém. Não quero ser. Mas também não sou tão diferente assim, vá lá... Quero apenas poder gozar do meu direito inalienável de ser eu mesmo. Do jeito que eu bem entender. E só.

(Tudo isso para dizer que sim, topo o que considero um verdadeiro desafio de escrever um conto...)

segunda-feira, 14 de julho de 2008

Cuidado com a filosofia...

...porque ela pode acabar te mostrando que a caixa de pandora na realidade pode ser sua própria mente...

domingo, 13 de julho de 2008

Do que gosto

Gosto de gostar
Gosto do gosto de gostar e dos gostos das coisas que gosto
Gosto de gastar
Gosto de deixar pro final o mais gostoso
Gosto de cuidar sem obrigação de cuidar
Gosto de inventar
Gosto de reinventar
Gosto de re-reinventar(-me)
Gosto de olhar e de pôr o dedo e de ficar imaginando como é por dentro
Gosto de lamber os dedos e esfregar na cara pra ficar com o cheiro
Gosto de cadeira com encosto regulável pros dias chatos
Gosto de ouvir. E de escutar.
Gosto de crispar as mãos até os nós dos dedos ficarem brancos
Gosto de relaxar a mão depois de fazer isso
Gosto de andar. Gosto muito de andar...
Gosto do ócio nada criativo
Gosto de luz. Muito, demais até...
Gosto de mim cada vez um pouco mais.

sábado, 12 de julho de 2008

Aforismos

Quem me conhece sabe que adoro umas frases...
De vez em quando eu saio com uma. Muito embora eu seja um ser prolixo (até demais, mea culpa), adoro a força de uma frase.
Simples. Direta.
À medida em que eu for lembrando, vou editando neste post.

- Os suicidas são as pessoas mais impacientes que existem.

- Se uma solução depende de uma pessoa, não é solução. É problema...

- A pior solução ainda é melhor que o menor dos problemas.

- Após cruzar com algum imbecil no trânsito o que consola é saber que ele certamente irá encontrar algum mais ainda que ele em seu caminho...

- Existem as coisas certas, as coisas erradas e as coisas que fazemos.

E por aí vai. Tem mais, mas minha memória é um artigo de luxo que nem eu banco...

sexta-feira, 11 de julho de 2008

A máquina e eu

As engrenagens ainda rangem, todas as vezes em que a máquina entra em operação. Pode-se dizer até que já faça parte, de certa forma, do próprio funcionar dela. Os sons emitidos, os cheiros exalados, de graxa, de fumaça...

Ela tende a girar de modo lento inicialmente. Mas não porque haja uma necessidade de incrementar-se a velocidade de maneira gradual. Caso ela fosse programada para tanto, mal ligada já estaria a plena carga, atingindo de pronto sua maior rotação. Mas não é o caso. Não hoje.

Mal começa, hesita parece, mas enfim põe-se em movimento. Ato contínuo, de pronto começam a surgir os primeiros elementos. Poderia até dizer-se que são "fabricados", mas não. Eles fazem parte da própria máquina. Ela os pare.

De frente para a janela, o reflexo dela parece misturar-se à imagem que vê-se através dela (a janela). Fundem-se num realismo fantástico. Brincam com nossa capacidade de focar: estaria no primeiro plano? Sei lá... Não consigo no entanto deixar de olha-la. Encanta-me. Algo acontece porém num determinado instante que eu jamais poderia imaginar...

Não sei se mais uma ilusão (de ótica, será?), vejo agora no reflexo a fusão entre a máquina e eu mesmo. De repente, vejo-me parindo a mim mesmo. Em princípio, acho graça. Mas passa. E rápido. Vem em seguida um desespero, que logo se aquieta também. Por fim, o mais simples: contemplo, placidamente. E lembro-me, aliviado, que basta eu parar de olhar para a janela que irei novamente ter minha vida de volta, meu corpo retomado. E faço isso.

Mas já não sou mais eu mesmo. Agora é tarde. A transmutação começou. E, por mais estranho que possa soar, parece-me que a máquina na verdade o tempo inteiro era eu mesmo, me fazendo brotar coisas novas de dentro das mesmas antigas. E me vem, por fim, enfim, um sentimento de alívio, mas daquele que nos assoma quando vemos que o caminho não é tão estranho assim - afinal, vai nos levar até a soleira da porta da nossa casa - mas o trajeto promete ser totalmente diferente.

Prendo o fôlego. E sorrio. Como quem pula da ponte para morrer afogado e deixa a água penetrar seus pulmões. É a morte consentida. Mas não aquela nossa, ocidental e das carpideiras, mas a da passagem para um novo estado, mais iluminado (se o caminho for devidamente bem trilhado, é bom que se diga).

quinta-feira, 10 de julho de 2008

O que era mesmo?

O que cala incomoda como
O que fala liberta.
O que vela disfarça como
O que descortina espanta.
O que nega não se engole como
O que se afirma não em si basta.
O que escancara só esconde como
O que reserva apenas dorme.
O que não compreende desfaz como
O que se revê se questiona.
O que dói silencia como
O que vive vale a pena.
O que segura permanece como
O que prende rumina.
O que quer faz como
O que não quer, manda...

segunda-feira, 7 de julho de 2008

Hiperestesia

Já acordou no meio da noite com um mau pressentimento?

Daqueles brabos? Essa coisa de conexão pode ser perturbadora...

terça-feira, 1 de julho de 2008

Ensaio sobre pardais

Pardais são assim: alegres. Naturalmente. E nem se importam com isso; também, nem poderiam... Seu estado de eterna felicidade não os permite pensar muito nas causas. Vivem apenas. E não venham dizer com isso que nem por um minuto eles por acaso sejam inconseqüentes! De modo algum! É porque realmente não é do feitio deles mesmo.



Eles sempre voam em bandos, muito embora tenham uma necessidade incompreendida de não muito longos vôos solo. Independe a duração: eles tem que ao menos existir. Nessas horas, os pardais procuram alimentar-se em diferentes paragens, novos gostos. Acredita-se que isto seja o verdadeiro motivo pelo qual eles têm essa plumagem tão exubertante e única, no meio dos bichinhos que voam.



Eles costumam acasalar e montar morada cedo, mas tendem sempre a deslocarem-se, formando ninhos em diferentes lugares. Não sabe-se ao certo ainda o por quê desta conduta nômade. Talvez pela necessidade de criar novos vínculos/quebrar antigos... Mas mesmo considerando todo esse afã migratório, eles invariavelmente retornam ao local de origem ocasionalmente.



Seu canto não é dos mais conhecidos entre as aves, mas merece especial destaque. Este desconhecimento geral a respeito dele deve-se principalmente porque ele tende entoar seu canto de modo muito velado. Mas como é bonito seu canto! Agudo, afinado, repleto de vida e cores... Fosse humano e fêmea, pertenceria a uma uma belíssima voz de soprano, daquelas que fazem a gente acreditar que anjos realmente existem. Daquelas que embalam cenas bonitas em que se exibe a natureza em todo o seu esplendor.

Amo os pardais. Desmesuradamente. Descobri-os há pouco, é bem verdade, mas como viver sem eles agora?

Observo ao longe seu ninho, ouço à distância seu canto alegre, vejo com olhos míopes seu quase teatral menear de cabeça que me faz rir...

Não deveriam ser criados pardais. Há até os que tentam, mesmo com todo o cuidado do mundo, com todo o carinho, amor e dedicação. Alguns até aproximam-se da essência da vida deles, mas será mesmo? Talvez eu na verdade não esteja preparado para criar um. Ou melhor: não queira aprisionar um.

Acredito estar disposto realmente é a tornar-me um deles, para assim poder entendê-los melhor e ao deixar aflorar minha natureza-pássaro, um dia, ser feliz de fato.

domingo, 29 de junho de 2008

O caminho e a perda (ou o medo dela)

Tenho lido sobre o budismo, minha nova paixão, dentre tantas... A do momento. Ele tem uma coisa de libertária que me cativa. Bate comigo. Muito embora vários conceitos neste momento me escapem a compreensão, algo me diz que estou mais perto de encontrar algumas respostas nele...

Ele fala muito da gente enquanto energia, parte de um todo, em constante mutação, inteiros num grande fluxo universal. Daí o conceito de morte passa a deixar de ter o sentido que normalmente nós ocidentais de maneira geral atribuímos.

Mas o medo da perda é devastador. Não me imagino um dia conseguindo livrar-me destes grilhões...

De todas elas. Das menores, até. Das diárias. Das grandes, enormes, como a de perder quem a gente ama. Essa de longe é a pior de todas. Tenho muito medo de perder quem amo. Rezo muito para que isso não ocorra, principalmente agora. Meu mundo iria ficar vazio demais. O meu e o de um monte de gente, é bem verdade...

Mas o consolo de sempre é saber que tudo no final acaba bem. De um jeito ou de outro... E que as coisas são sempre como devem ser, muito embora a gente nem sempre concorde com o rumo que as coisas na vida tomem.

sábado, 28 de junho de 2008

...

Apregoam por aí certas "verdades", tal como a palavra cansar. Palavras não cansam, nem mesmo os ouvidos cansam de ouví-las se elas vem com o intuito de construir e são revestidas de sinceridade. Palavras ferem, maltratam, magoam. Mas não cansam. Não ficam velhas, não desbotam. Não são tecido, e ao mesmo tempo tecem os relacionamentos, as vidas das gentes por este mundo...

Eu já quis matar a palavra. A palavra quase morreu, ou viveu combalida no máximo, em virtude desta tentativa de assassinato. Mas ela sempre se renova. É dotada desta capacidade de regeneração fantástica tal como certos animais. A palavra é um animal. Indômito, irrefreável, mas não cansa. Não deveria, ao menos.

Hoje disponho da palavra apenas. Nela me escudo, por ela vivo e nela me traduzo mais do que verdadeiramente me defino. Não sei se será sempre assim. (Serei eu sempre assim?) Mas não me calem a palavra. Não me tirem o gosto doce dela, que gira em minha boca como uma bala de cravo, ou de canela...

À frente nem todos os papeis, telas de computadores, teclados ou qualquer outra forma de registro será capaz de abrigar todas as palavras que virão. Nem mesmo eu sei se serão elas tantas... Imagino que sim. Algumas novas, outras nem tanto, mas seu significado tende a mudar, mesmo nas já tão bem conhecidas.

Não falo em um libelo de renovação total, mas antes, um verdadeiro apego à palavra enquanto expressão máxima das coisas que a mim são determinantes. Algumas palavras, porém tem um peso imenso: "só", para citar apenas uma. Seu significado, sua transcendência não me fixa, não consigo meter minhas mãos nela (a palavra) e revirar suas vísceras como um açougueiro displicente e apressado. Não tenho pressa, mas não vivo bem o só.

Tudo vem cada vez mais e mais como uma expressão última de busca do verdadeiro sentido, uma etimologia da alma, alicercada pelo amor à palavra, pela devoção a mesma. E pela vontade extraordinária e piromaníaca de imolar-me. Arder, arder até não mais poder. Queimar, ver-me reduzido a cinzas, mas ver-me nelas e de maneira muito mais forte do que antes, enquanto matéria palpável e de forma aceita.

Não busco a paz. Amo a desordem, o caos. Mas o tranquilo me aninha e me faz ver que ambos são necessários. Estar só e não ao mesmo tempo. Isto poderá ser compreendido/partilhado? Não sei... Não quero saber agora. Não é o momento. E volto para a palavra, e a da vez é solidão. Mas uma solidão safada, calhorda, convivida. Cômoda, em última instância.

Mas como criticar a pequena ave no ninho, ou o carro no pátio da auto-escola nas mãos de um adolescente trêmulo? Potesta, potesta. O poder. O poder de mover, a energia recolhida, o potencial querendo virar cinético. Quem há de criticar isto? Mas paciência... É chegada a hora. Mas este "só" me acaba... Mas tem que ser. Mas não quero. Mas tem que ser. Mas tento fugir dele. Mas...

Vejo agora que nem todas as palavras me são suficientes. Em algum tempo, era a vontade de demonstrar uma pseudo-erudição. Hoje ela vem na necessidade de traduzir sentimentos. Mas pensando bem, por que fazê-lo? A palavra neste instante não acaba tornando-se um mero "cavalo" de mim para o mundo exterior? E eu preciso, ao menos agora? Talvez não. Mas a sensação de um segredo que precisa ser compartilhado, uma boa-nova inaudita me persegue. Mas devo resistir.

Ao mesmo tempo, posto ou não posto, eis a questão. Vão me ver, podem me ler, podem tentar até me intuir. Mas eu não estou aqui. Apenas minhas palavras. As mesmas, as de sempre, as tão valiosas, as que nunca cansam, mas que não dizem nada. Ao menos, neste momento, não me deixam dizer BEM ALTO o que eu realmente desejaria. Então, abuso delas, bolino-as sem o menor pudor, recato ou consideração.

Mensagens subrepitícias: elas acabaram, as palavras, servindo apenas para isto, agora. Que seja. Que leia. Que entenda (ou não). Mas que, por tudo o que se vive, não deixe a palavra partir. Ou cansar...

Shhhh....

Não me dê estas vestes
Negras
Recuso-me ao luto.
Vestir-me-ei sim, mas da brancura dos lírios da noite
Pois minha pele despida arrepia neste frio
Minhas mãos crispam-se e agarram-se ao ar. E arranham até chegar ao osso.

O ser liberto sabe não se quer o toque firme de mãos que mais soltam que aprisionam.
O sentir pensado dualmente vê-se minguante.
Natimorto, não descansa fácil
Ungido nas espumas da esperança
Do vir-a-ser.

Cale-se a noite,
Cale-se o mar,
Cale-se a luz,
Cale-se a dor,
Calem-se todos e ouçam a melodia que quase sussura, flutua pelo ar e atinge como seta
Mas não fere
Porque não deve. Não pode...

As coisas mais belas moram no silêncio.

sexta-feira, 27 de junho de 2008

Brustschmerzen

...e essa dor no peito que não cessa...

Tem umas músicas que sempre deixam a gente feliz, ou triste. Sem nenhum motivo aparente, apenas pela beleza intrínseca. Feito essa:

Ela une todas as coisas
como eu poderia explicar
um doce mistério de rio
com a transparência de um mar ?

Ela une todas as coisas
quantos elementos vão lá …
sentimento fundo de água
com toda leveza do ar

Ela está em todas as coisas
até no vazio que me dá
quando vejo a tarde cair
e ela não está

Talvez ela saiba de cor
tudo que eu preciso sentir
Pedra preciosa de olhar !
Ela só precisa existir
para me completar

Ela une o mar
com o meu olhar
Ela só precisa existir
pra me completar

Ela une as quatro estações
Une dois caminhos num só
Sempre que eu me vejo perdido
une amigos ao meu redor

Ela está em todas as coisas
até no vazio que me dá
quando vejo a tarde cair
e ela não está

Talvez ela saiba de cor
tudo que eu preciso sentir
Pedra preciosa de olhar !
Ela só precisa existir
para me completar

Ela une o mar
com o meu olhar
Ela só precisa existir
pra me completar

Une o meu viver
com o seu viver
Ela só precisa existir
para me completar

("Ela une todas as coisas", de Jorge Vercilo e Jota Maranhão)

(Re)Gênese

...na beira do mundo, esperando, adivinhando chuva, muita...

quinta-feira, 19 de junho de 2008

E...

E queria escrever crônicas. Ou melhor, quero. E vou. Mas antes preciso olhar mais os olhos das pessoas que passam apressadas por mim (ou quem sabe, diminuir meu próprio passo para vê-las melhor).

segunda-feira, 16 de junho de 2008

Lampreia

Assuma sua natureza, arrisque se largar, ache seu caminho e consuma a si mesmo até o fim.

quarta-feira, 11 de junho de 2008

O Grande Exército

E assim, pouco a pouco foram juntando-se as hordas. Vindas de tribos distantes, outras nem tanto. Quase todas falavam a mesma língua, muito embora algumas praticavam ritos estranhos, pois mal falavam e comunicavam-se quase que exclusivamente através daqueles. Umas poucas, essas vindas de terras realmente longínquas, falavam uma espécie, cada qual a sua, de dialeto que só conseguiam ser compreendidas entre os seus, dificultando sobremaneira a integração ao Grande Exército. Com relação aos costumes, estes então dir-se-ião ainda mais diverso e multifacetado. Mas de forma quase que milagrosa, todas as diversas hordas conseguiam, ao seu modo bem peculiar, unir-se em torno e em direção do que se convencionou, após várias e várias batalhas como o Fim.
Vez por outra, é bem verdade, surgiam aqui e acolá pontos de insurgência, pequenos motins, mas que normalmente eram debelados, ante à força opressiva da maioria. O que ocorria, de maneira quase que reiterada era durante a Grande Marcha divergências ferrenhas, muito violentas, quase destrutivas – quando não o eram enfim, em última instância... – e que obrigavam as hordas a mudarem suas estratégias, reagruparem-se e por fim, mudar o curso, sem no entanto – e isto é a parte mais intrigante quando analiza-se o Grande Exército – alterar-se o Fim...
Volte e meia, algumas tribos mandavam novas hordas para substituírem as que as representavam, por motivo que só mesmo eles poderiam explicar ou entender. O fato é que esta alteração invariavelmente conseguia dar novos ares ao Grande Exército, mas após algum tempo, como haveria de ser, tudo voltava a ser igual a como era antes: o frescor nada mais era que passageiro. Mas nem por isso, menos necessário. Grupamentos destacados dentro das fileiras do Exército tinham representantes que comandavam as discussões, lideravam enfim. Mas com uma característica bastante interessante de serem formados de modo transgrupal.
Quanto às táticas de guerra, o Grande Exército não diferia dos demais exércitos. Sua principal estratagema era a da terra arrasada: tomavam de assalto o vilarejo, possuiam todas as mulheres, consumiam todos os mantimentos disponíveis e, ato contínuo, após fartarem-se de tudo o quanto fosse humanamente possível, partiam em busca de novas paragens, não sem contudo atear fogo em toda a vila, de modo que nada mais pudesse ser aproveitado ou cultivado; nada restava salvo sal e cinzas.
Mas tamanha força era ao mesmo tempo uma das grandes fraquezas do Exército, pois devido ao seu tamanho, arcava com o ônus deste gigantismo auto-imposto prestava-lhe o enorme desfavor de fazê-lo crer ser indestrutível. Como isso nunca era verdade, as baixas invariavelmente tendiam a ser proporcionais ao seu tamanho. Por vezes até, julgava-se que ele iria implodir por assim dizer, simplesmente deixar de existir. Mas talvez esse fosse o grande trunfo dele, ou seja, o de fazer com que todos pensassem que de tão combalido não teria outra alternativa que não dispersar suas fileiras: eis que surgia sempre e sempre, renovado, diferente mas igual.
Pergunta-se sempre qual foi o fim do Grande Exército, se ele teria atingido o Fim, conclusa a Grande Marcha. Não se sabe... Ele simplesmente desapareceu em algum lugar do tempo, alhures. Apenas sabe-se de sua existência pelas marcas deixadas ao longo do caminho e da história. Ele sempre será venerado, conhecido por vários nomes, dentre os mais conhecidos Amor, bem como sua Marcha a Vida. E o Fim? Ah, o Fim... Este parece ser um desconhecido e impronunciável nome feminino...

domingo, 1 de junho de 2008

De outro blog (clique aqui para conhecê-lo)

"De forma temporária, a insanidade veio sem ser chamada e gri­tou: 'Entre, a porta está aberta.' Por sorte, a Realidade chegou ines­peradamente em casa e encontrou a Insanidade Temporária vagando livre pelos corredores da minha mente, entrando nos quartos, abrin­do armários, lendo minhas cartas, espiando dentro de minha gaveta, esse tipo de coisa. A Realidade correu e chamou a Sa­nidade. Depois de uma briga, ambas conseguiram expulsar a Insa­nidade Temporária e bateram com a porta na cara dela. A Insanidade Temporária agora está caída em cima do cascalho da estrada de aces­so da minha mente, arquejando, furiosa, e gritando: 'Ela me convidou para entrar, sabem? Ela me convidou. Me queria lá.' "

Considerações sobre o belo e o espírito das palavras

O que é belo o é em si? Consegue encerrar, ser começo-meio-fim prescindindo de ver-se avaliado? Ou necessita do outro, da visão do outro para tornar-se belo, no sentido amplo? Uma escultura de Gauguin, um quadro de Dali ou uma flor são intrinsecamente belos, é sabido. Mas o que os torna de fato, ao meu ver, belos são nossos olhos, como os vemos. De que adianta o belo esmerar-se em encantar e seduzir se ele não consegue ser um objeto de adoração? O que é o bonito sem o "ver o bonito"?
Essa coisa da beleza me persegue há anos. Sempre busquei um belo, mas essa busca quase insana por um esteticamente irretocável me fez deixar de ver as minúcias das quais as coisas belas alimentam-se. No fundo, tudo pode ser belo; basta um olhar sob o ângulo preciso, com a luz - essa maldita luz - apropriada e tem-se a beleza capturada e pronta para assimilação em e de sua plenitude. Mas esta expressão imagética que se imprime na retina, vira sinal a percorrer o nervo óptico até o cérebro que nos faz ver que "ela é tão bonita que na certa a ressussitarão" consegue de fato ter todo esse poder? Essa re-gênese do belo e fez começar a escrever estas coisas agora: uma imagem arquivada na cabeça que, ao simples ato de ser rememorada, consegue ter a força de mil mares tomados de fúrias assassinas, agitados pelo signo das intempéres e dos furacões.
De certa forma, pensando por este lado, de que me vale ter o mais belo em mim se não é visto, admirado, brincado de encanta-moça? E que belo seria esse? Talvez para expressá-lo fosse necessário buscar na etimologia da palavra definitiva nascida da língua criada ao se fundar uma Nova Germânia, onde se possam unir palavras sem-número para conseguir sintetizar um sentimento, porque talvez as palavras que existam não sejam suficientes para tal.
Enfim, o belo em mim e fora de mim - pelo mundo, entre salares e asfalto orvalhado - precisa de mim, precisa de ti para ser mais belo, no mínimo. Sem esta chance, o que é belo torna-se apenas... belo! De que serventia tem o belo em si? O belo quer ser belo-belo, quero-quero (ah, se quero...): Vida noves fora zero, né Bandeira?

segunda-feira, 26 de maio de 2008

Esquerdinha...

Percorrendo o "Releituras" e me deparei com uma graça boa pra rir num domingo à noite na cama, com o notebook deitado também porque esquenta a barriga. O nome do autor é Bernardo Rodrigues, e fora uma ligeira forçada de barra na parte em que alfineta os políticos, vale umas boas risadas... Clica no título do post e vê lá.

domingo, 25 de maio de 2008

Se...

(Para ler ao som de "Um Branco, Um Xis, Um Zero", com Cássia Eller ou "It Had To Be You" com Billy Holiday)

Se tá tudo errado, então desfaz.
Se o tempo está chuvoso, fica em casa.
Se o fogo tá baixo, deixa o bolo fora senão vai solar.
Se a volta é muito grande e a grana tá curta, pede pro táxi parar e continua a pé.
Se tá fora, deixa.
Se é fácil, então resolve.
Se é feio, então tira o olho.
Se faz mal, te medica.
Se "era pra ser", deixa de estar.
Se "era uma vez", então "fim".

Campanha "Ajudem Marcilio a Não Pirar"

Tenho uma profunda relação de amor e ódio com a rede wireless de minha casa.
Adoro a praticidade de, por exemplo como agora, poder ficar na minha varanda, espiando o mundo e poder estar conectado. Mas de vez em quando essa droga cai, e parece que adivinha... Sempre quando o que escrevi vai ser postado, ou o email enviado. Aí perco o texto, fio da meada, o prumo, a compostura e tenho vontade de mandar tudo à merda, inclusive a crase.

Mas como eu estava escrevendo anteriormente quando fui mais uma vez traído por minha rede, na minha busca já antiga pela bendita crônica de Antônio Maria sobre uma mulher com a qual ele cruza na calçada, que como já escrevi li na Livraria Síntese, de pé e não comprei o livro porque era um liso de dar dó (a Síntese já era, Antônio Maria também, mas este liseu...), deparei-me com um site interessante, que como sói faço, já incluí na minha lista de favoritos:

http://www.releituras.com/index.asp

Dêem uma visitada e leiam Maria... Ele era maravilhoso... E ainda por cima, conterrâneo. Só não desculpo-o por não ter escrito "Valsa De Uma Cidade" ("Rio de Janeiro, gosto de você...") pra Recife também.
Mas tem um monte de outras coisas legais também. Confiram!

...e dei pra fazer poesias de novo.

Pois é... Depois de tantos anos, parece que estou fazendo as pazes com as palavras novamente. Então, com a devida licença, vai minha cria:


Circular

Contas
Que contam
Contos
De pedras e sementes colhidas
E que viram canteiro e plantação
No terreno-carne
Do teu pescoço;
Viraria rocha, planta, cordão e metal
Para poder roçar tua nuca
e repousar no teu seio
despudoradamente;
E ainda disfarçado de adorno,
Te envolver completa e totalmente
Enfim.

sábado, 24 de maio de 2008

Above all clouds...

(Escrito num vôo SPO/REC)

Vejo pessoas, homens, mulheres e crianças voando literalmente junto comigo, numa velocidade absurda, indo talvez pra casa, talvez fugindo dela... Como todos estão juntos, permito-me pensar que por um período de tempo (a duração do vôo) todos compartilham de um mesmo objetivo. Mas qual será verdadeiramente o meu? O que me move, de fato? O que põe-me nas alturas? O que me faz dar rasantes, loops e acrobacias para encantar a platéia e para meu próprio deleite? Não sei ao certo. Não é uma coisa apenas, penso eu, mas um monte delas. Mas essa viagem, esse vôo precisa ser solo para só então, adquirida a destreza necessária, permitir-se acompanhar. Tenho medo deste pensamento, muito embora pareça-me adequado neste momento. Pela segurança. “Senhores passageiros, permaneçam sentados e com os cintos de segurança afivelados, pois estamos atravessando uma área de turbulência”. E que turbulência.

Li numa revista: o animal satisfeito dorme. E vira presa fácil. A inquietação é que move o mundo. O questionamento, a dúvida, o perseguir as respostas, que nunca serão nem absolutamente certas nem tampouco definitivas é mais do que um fim em si, mas talvez mais o que compele o moto-contínuo que é a vida da gente.

Como alguns não conseguem viver esse afã? Como achar-se pronto e acabado? Desprezar todos os filósofos, os que passaram a vida toda pensando e eternizaram-se através do fomento à busca de respostas? Como não deixar-se ser praticamente violentado por todas as coisas, cores, sons e cheiros que habitam esse mundo, mundo, vasto mundo?

Já me chamaram de disperso, viajado, disseram que me perco em elocubrações sem fim, que penso demais, que complico tudo, que não sei ser feliz... Já me disseram tudo isso e muito mais, mas nunca me perguntaram o porque disto tudo. Nem sei ao certo se saberia responder. Mas com certeza teria uma contra-pergunta na ponta da língua: e porque VOCÊ não é assim também?

O caminhar tende a ser bem mais interessante quando se aprecia a paisagem, ruminando as idéias, quando nos damos tempo e espaço para pensar e sentir. E isso é natural, é necessário, obrigatório.

Não ser mais uma alma no arrebol, ser um ser pensante, vivente e "sentinte". Esse é meu caminho, carma e prazer.
(Pensando bem, ao invés de vôo, navegar a dois talvez fosse bem melhor... Quem sabe pelas Ilhas Gregas, apenas com o Mar a embalar e a Luz de um farol a guiar?)

Parafraseando Pessoa

Todas as canções de amor são ridículas. Não há exceção honrosa. Ao mesmo tempo, são necessárias. Absurdamente. Pegamos emprestados a alma, a inspiração do autor, do cantor para nós mesmos. Tomamos carona nos versos musicados alheios despudoradamente, na cara-de-pau mesmo. A gente precisa cantar o amor, a paixão, a desilusão, a solidão... Esta normalmente não faz-se de musa com muita freqüência. Todos fogem dela, como da morte. Essa então, coitada, ninguém canta. Nem os mais inspirados deprimidos.

A graça mora no belo, mas sem esquecer jamais que o feio precisa existir, mais do que pela simples necessidade de um contraponto. Nesta contradança, o mal e o bem são pares. E embalados ao som de quê? Das velhas canções de amor.

Eu, por minha vez, nunca escrevi canções de amor. Nunca consegui ser ridículo o suficiente. Contentei-me ao longo do tempo em me apropriar destes latifúndios musicais vastos e extremamente produtivos. Fiz-me posseiro destas terras. E além de assentar, chamei pares, aos montes, para habitar estas paragens... E fui muito feliz todas as vezes. E fiz felizes seres também. O problema? O problema porém foi sempre ter que levantar acampamento no meio da noite, pro meio do nada... E para isto não há canções que me acompanhem, me dêem guarida nem desculpa.
E sigo cantando o amor, sempre através das mesmas canções. Das mesmas deliciosamente ridículas canções de amor...

quinta-feira, 8 de maio de 2008

Palavras, palavras, palavras

Adoro palavras.
Adoro palavras lidas em voz alta pra ouvir o som e passar a poesia.
Odeio voçê, agente, embreagado e musica baiana, não necessariamente nesta ordem...
Odeio presunção estilística e escrita rebuscada, muito embora ache mesóclise tão lindo quanto um por-de-sol visto de um avião ou o sorriso de uma de minhas filhas...
Amo ouvir vrido, prástico, apoi e ruma.
Adoro o som das coisas da minha terra como pitoco e tabacudo.
Odeio dicionários de pernabuquês, cearês, baianês e pqpês.
Adoro etimologia e ficar viajando que o povo fala "muitcho" por influência do espanhol.
Adoro escrita certinha, sem erros crassos, com parágrafos e muitos ponto-e-virgulas e crases.
Odeio "tão simples quanto", "bojo", "gancho" e todas as palavras da moda corporativa.
Adoro não saber usar por que e por quê - odeio mentir que adoro só por preguiça de não estudar pra entender...
Adoro Kafka, Saramago, Quintana, Bandeira e Antônio Maria por causa de um conto que li em pé na falecida Síntese e que nunca mais consegui achar de novo (quem tiver aquele que ele fala de uma mulher que vem do outro lado da calçada, pelo amor de Deus me mande!).
Odeio Coelho, Coelho, Lia Luft na Veja fazendo propaganda do novo livro dela e Coelho (todos o Paulo, porque o bichinho acho uma graça e uma delícia na brasa).
Adoro ter filha professora e amigas jornalistas e muito escrever muito.
Adoro ser lido, relido e comentado (isto é uma cantada, pra que não reste nenhuma dúvida!).

terça-feira, 6 de maio de 2008

As voltas que o mundo dá (?)

Diz Karl Marx em seu primeiro parágrafo de "O 18 Brumário de Luís Bonaparte" algo que li quando tinha uns 16 anos (é, faz tempo pra cacete mesmo...) e que no entanto nunca esqueci. Transcrevo:

"Hegel observa em uma de suas obras que todos os fatos e personagens de grande importância na história do mundo ocorrem, por assim dizer, duas vezes. E esqueceu-se de acrescentar: a primeira vez como tragédia, a segunda como farsa."

Isso nunca saiu da minha cabeça. A frase sempre foi perturbadora, e enseja duas idéias igualmente terríveis: a história se repetir e fazê-lo como farsa. Acredito em parte nisso até hoje. Não que eu considere que todas as coisas estejam fadadas a um fim inexorável quando imaginamos estar diante de uma repetição de fatos/pessoas; antes, acho que de fato existe uma tendência, talvez às vezes por ansiosa condição nossa, de que as coisas acabem por virar uma caricatura do original sim, mas mais em virtude de uma tendência de escapar do novo. Submetemos uma situação ao gabarito de uma pré-existente porque nos é mais seguro, mais confortável.

Desvio um pouco do pensamento de Marx. Trago o pensamento dele para o campo das minhas coisas, mais mundanas mas não menos importantes...

Enfim, acredito que o novo pode ser de fato novo, se assim o permitirmos. Livre de amarras, de comparações, de pressupostos... A um só tempo deliciosamente desafiante e assustador. Penso hoje que parte de minhas experiências neste sentido tenham ficado presas a esta coisa de querer padronizar tudo.

O eterno retorno de Kundera talvez também não resista a esta ruptura desse novo-novo. Mesmo quando ele tem tudo pra ser um "de novo". Nunca é. Não pode ser, não tem como. As circunstâncias da vida da gente são outras, as pessoas, os tempos, as idéias e até os defeitos podem (e de fato o fazem) afetar esta pseudo-repetição.

E viva o novo. De novo!

segunda-feira, 5 de maio de 2008

Vai aí um "perfil musical". Sempre achei o fim da picada aquela de "essa música é minha cara", sério mesmo... Mas pra um cara musical como eu, meio que não tem como escapar de me definir através de letras de músicas, algumas realmente maravilhosas.
Pra quem já teve o prazer (ou infelicidade, há quem ache) de cruzar meu caminho, tenho certeza que não vai ser novidade nenhuma. Pra quem nunca me viu mais gordo (falando francamente, nem eu mesmo...), segue como uma "cola", ou "fila" como falam na minha terra... Por ordem de relevância - hoje, ao menos:

Bola de meia, bola de gude (Milton Nascimento e Fernando Brant)
Tudo pela metade (Marisa Monte e Nando Reis)
Caçador de mim (Sérgio Magrão e Luís Carlos Sá)
Pense e dance (Dé, Frejat e Guto Goffi)
Escrúpulo (Lula Queiroga e Lenine)
Que o Deus venha (Frejat e Cazuza, sobre texto de Clarice Lispector)
Na boa, acho que ninguém vai ler isso... Nem sei se vou escrever sempre também, mas a idéia de poder colocar o que penso para que todos possam ler, saber, entender como penso (ou acho que penso) é bastante sedutora. Talvez satisfaça enfim minhas veleidades literárias; talvez seja só mais um monte de porcaria para ajudar a encher os discos do Datacenter do Google, sei lá... Não vai ter linha, propósito ou definição: apenas eu, um teclado e um monte de idéias na cabeça. Dig in!