quinta-feira, 20 de novembro de 2014

Onde fica a tecla "mute"?

Eu falo muito. M-u-i-t-o. Falo pelos cotovelos, pelos antebraços, pelas (e com) as mãos, pego o caminho de volta e falo pelo braço, ombro, omoplata, até fazer um desvio pra dentro e falo pelo coração...
Falo das coisas que sinto, narro meus sentimentos até. Conversar comigo às vezes deve dar a sensação de assistir a um filme ouvindo os comentários do diretor. Chato, deve ser. Para uns; para outros não. Pouco importa. É minha forma de passar pro lado de fora do muro de mim (que existe e não, não se engane, perde feio quando eu quero pro antigo de Berlim ou novo da Cisjordânia) tudo o que sinto, penso.
Se eu estivesse do outro lado da mesa ou da cama, acharia engraçado mas ao mesmo tempo interessante ver alguém se dispondo a explicar e detalhar e expressar todos os mecanismos internos do pensamento de si mesmo... A tradução em forma de palavras e trejeitos das engrenagens mentais, ronc-ronc-ronc, da pessoa. Não que seja isso tarefa fácil de experimentar. Não mesmo. Acho que torno fácil. Nem tampouco algo que se deva tomar como absoluta e estanque verdade, definitiva e definidora de todas as minhas convicções, credos, dogmas, preconceitos (é, eu sou mais um vil de Pessoa). Mas alto lá que não há nenhuma incoerência nisso, nem tentativa de lançar flares para os mísseis guiados pelo calor dos meus sentires. É que nada é permanente. Busco a coerência em todos os meus atos, mesmo os mais insanos e tresloucados (e assim já tomo a dianteira de quem vier dizer que alguns assim o foram - perdeu, playboy, já admiti!).
Nesse caminho, as palavras ditas são a terra, as pedras e o piche dessa estrada para a qual convido meu interlocutor a trilhar pra dentro de mim. Mas nada de egotrips ou discursos monocráticos e vaidosos de mim sobre mim mesmo, porque tão logo finda a tarefa de passar o meu recado e mais meia dúzia de coisas que acho que ajudam a contextualizar, exercito a (pra mim) arte de buscar um nexo de sintonia com quem eu falo, citando algo que já foi dito ao longo da conversa anteriormente ou sei dela pessoalmente, como que pra fazer uma ponte onde eu, finalmente, passo a palavra, a bola, a mesma possibilidade de que o outro fale tanto e tão profundamente de si o quanto eu fiz até então. Muito maior do que o prazer de falar o que penso/sinto é o tesão de poder mergulhar no outro, em seu universo íntimo e particular. Minha forma de convidar doce e sedutoramente a um belo passeio a dois...
Certa vez disseram, com uma propriedade que não merecia vindo de quem veio, a definição de que tenho a enorme capacidade de produzir auto-diálogos (ao menos a pessoa foi bem feliz na ironia fina e contundente da definição) onde eu consigo falar, dar eu mesmo a réplica, tréplica, políplica e se brincar, entrar numa discussão ferrenha e sanguinolenta sem que a pobre pessoa do outro lado tenha a chance (desnecessária, vai...) de sequer proferir uma só palavra. Sou assim mesmo, fazer o quê, se me amo inclusive por esse meu jeitinho? Charme pessoal, pelo menos na minha contabilidade de atributos.
De uma coisa, enfim, tenho cá comigo uma certeza que me permito considerar quase que absoluta: conversar comigo é, no mínimo, divertido. E envolvente e nunca algo pra alguns parcos minutinhos. Horas de relógio grande são necessárias.
Ah, já ia me esquecendo: tudo isso aí só vale pra quem me desperta isso, e por isso mesmo, as pessoas que mais amo, amo ouvi-las, fazendo da conversa um enorme e prazeroso passeio de montanha-russa misturado com bungee jump e ficar de bobeira com bóia de patinho na lagoa.
O melhor de mim sempre para as melhores pessoas para mim. Privilégio enorme meu em tê-las na minha vida.
E priu.

Um comentário:

Telma Ratta disse...

Adorei o "PRIU"! Mt massa esse texto, amigo. obg por compartilhá-lo cmg. Fico feliz pelo privilégio!